Ninguém estava esperando por uma sexta-feira comum virar notícia nacional com o desastre do voo 2283 da Voepass, que decolou de Cascavel (PR) para Guarulhos (SP) e caiu de maneira brutal em Vinhedo, matando todos os 62 passageiros e tripulantes. A cena do avião, um ATR 72-500 turboélice, despencando em espiral, pegando fogo em uma área residencial, chocou o país inteiro. Não faltaram perguntas: como uma aeronave considerada bastante segura pôde perder o controle desse jeito?
Assim que a tragédia veio à tona, o presidente da Voepass correu para afirmar: o avião tinha passado por manutenção e estava abastecido normalmente para o voo. Só que, conforme as investigações avançaram, uma verdade bem mais preocupante veio à tona. Técnicos admitiram que o sistema de degelo, fundamental para voos em certas condições meteorológicas, apresentava problemas que não foram registrados no livro de bordo antes do avião decolar.
Funcionários envolvidos na preparação do ATR 72-500 confessaram que deixaram de relatar oficialmente defeitos no sistema de degelo poucas horas antes da partida. Um dos mecânicos chegou ao ponto de declarar sentir um "remorso terrível" por não ter oficializado o problema. Esse detalhe faz toda a diferença, porque o sistema de degelo é o que impede o acúmulo de gelo nas asas e superfícies da aeronave – um risco real no inverno ou em nuvens densas, como as que o 2283 enfrentou no trecho entre Ribeirão Preto e Guarulhos.
A situação já estava sendo notada pela própria tripulação: depois de uma aterrissagem em Ribeirão Preto, os pilotos pediram atenção ao sistema de degelo, demonstrando preocupação real com a condição do avião. Mesmo assim, o conserto e a verificação não receberam o devido encaminhamento. Detalhe impressionante: nada disso ficou formalmente registrado antes do desastre final.
O voo trágico traz à tona o lado mais humano da aviação – tanto nas vítimas quanto em quem perdeu a chance de embarcar. Entre os passageiros estavam seis oncologistas indo para um congresso sobre câncer, quatro professores da Unioeste-PR e duas crianças. Outros dez passageiros escaparam da tragédia simplesmente porque esperaram no portão de embarque errado e perderam o voo.
Desde o início, a Polícia Federal assumiu o comando das investigações. Já foi possível identificar a falha mecânica — centrada no sistema de degelo e sua manutenção inadequada —, mas agora a atenção se voltou para fatores humanos: negligência, omissão no preenchimento dos registros e as decisões tomadas sob pressão dentro da rotina pesada da aviação regional. O acidente do voo 2283 ligou um alerta vermelho sobre como pequenos deslizes em manutenção podem custar caro demais.